quarta-feira, 19 de julho de 2023

 REFORMA TRIBUTÁRIA
Será o imposto seletivo a solução ou um problema?
Feita no improviso, criação pode gerar efeitos contrários ao pretendido e nefastos à economia













RESUME: A PEC apresenta problemas na definição de critérios e limites para tributação prejudicial à saúde e meio ambiente. Falta determinar a tributação adequada para cada bem e serviço, considerando fatores subjetivos e externos. Estudos sugerem que tributação maior não reduz o consumo. Economistas alertam que tributação extrafiscal requer estudos e não deve ser feita de forma improvisada. A proposta parece ser motivada por questões arrecadatórias.

                                                                                             Quarta-feira, 19 de julho 2023
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A Câmara dos Debutados aprovou, em ambos os turnos, a proposta de reforma tributária (PEC 45/2019) que, dentre as alterações, propõe a criação de um imposto seletivo. De acordo com a redação do substitutivo à PEC 45/2019, o imposto seletivo será de competência federal, com proposta de inclusão no artigo 153, VIII, da Constituição Federal e incidirá sobre a “produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, nos termos da lei”.  


A redação sugere a adoção das teorias que defendem uma tributação mais pesada em bens ou serviços que seriam prejudiciais à saúde, como a de Pigou e seus seguidores. O objetivo é desestimular o consumo e compensar os custos sociais negativos (ou externalidades negativas) que o consumo desses bens ocasionaria.  


Contudo, para além das acertadas críticas à reforma apresentada (sobretudo sob o ponto de vista federativo), há sérios problemas na adoção dessa visão teórica que merecem reflexão. Este artigo se presta a algumas delas.  


O primeiro deles é, justamente, a definição do que se considera prejudicial à saúde ou ao meio ambiente. Na PEC não consta qualquer critério para sua definição ou limites da sua tributação, o que pode dar margem para a criação de imposto seletivo sobre os mais variados produtos e serviços, permitindo justificativas que seriam pouco sujeitas aos controles de legalidade ou constitucionalidade. 


Mas ainda que se suponha ser possível elencar alguns bens/serviços que sejam, inquestionavelmente, considerados prejudiciais à saúde, o problema do imposto seletivo não se encerra nisso. Na verdade, com isso, surge problema ainda maior: como determinar qual seria a tributação adequada para cada bem e serviço?  


Não há informação necessária disponível para o governo mensurar essa tributação na proporção exata da externalidade negativa que pode gerar e considerar isso em face do custo gerado. Isso sem mencionar os diversos fatores subjetivos envolvidos na escolha realizada no momento do consumo, como as características do consumidor, o tempo e o local (para se falar apenas do óbvio). 


Em outros países que adotam essa forma de tributação, há um bom tempo, como os EUA, há estudos que indicam a inexistência de evidências que sejam suficientemente capazes de demonstrar que uma tributação maior de produtos prejudiciais à saúde leve à redução do consumo ou mesmo que essa tributação tenha tornado os indivíduos mais saudáveis ou contribuído para o sistema público de saúde de uma forma geral. De outro lado, há efeitos negativos que são possíveis de serem mensurados, como o aumento de importação e comercialização desses produtos de forma clandestina, além do potencial de regressividade dessa forma de tributação (ou seja, acaba-se por tributar mais que detém menor capacidade contributiva). 


É por todos esses pontos que há muito tempo economistas, como Ronald Coase e James Buchanan, têm defendido que a adoção de uma tributação para corrigir externalidades negativas não é a melhor solução.  


O próprio Pigou afirmava que o uso da tributação para correção de externalidades negativas deveria ter limites determinados, sob pena de se ter mais prejuízo do que benefício. 


Contudo, ao ser analisada a PEC não se constata qualquer limite para a tributação. Além disso, também não foi realizada análise sobre os efeitos que o imposto seletivo poderá gerar. Em realidade, não há uma preocupação nem se, ao menos, o imposto seletivo é o meio adequado para atingir a finalidade pretendida.  


Aliomar Baleeiro, ao tratar sobre a tributação extrafiscal mencionava que “qualquer técnica de tributação extrafiscal em bases racionais pressupõe o estudo dos efeitos de cada imposto em dadas circunstâncias e, notadamente segundo as tendências das conjunturas econômica” e alertava que “as negligências e improvisações podem ter o desfecho do conhecido apólogo do aprendiz de feiticeiro”.  


O alerta de Aliomar Baleeiro se encaixa perfeitamente com a proposta de reforma tributária atual. A criação de um imposto seletivo feita no improviso, além de poder não atingir os efeitos pretendidos, pode gerar efeitos contrários e nefastos à economia. Então, espera-se que, ao menos, sejam descortinados os motivos reais dessa mudança, que, aparentemente, são arrecadatórios.



Fonte > JOTA > PAMELA VARASCHIN PRATES

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